quarta-feira, 22 de julho de 2009

A lenda da rosa-de-cristo - 3ª parte

continuação…
Os anjos interromperam imediatamente os seus cânticos e fugiram espavoridos. A luz intensíssima desapareceu de repente, a pesada atmosfera de ouro diluiu-se e a escuridão voltou a descer sobre a floresta. Sentiu-se um frio glacial, as flores começaram a murchar e os animais correram a refugiar-se nas suas tocas. O murmúrio das cascatas suspendeu-se e as folhas tombaram das árvores como uma chuva de cobre.
O coração do abade apertou-se de dor ao pensar: «Os anjos do céu visitaram-me cantando, e um terrível brado afugentou-os». E nesse momento lembrou-se da flor que prometera ao arcebispo. Meteu a mão por entre os musgos para apanhar ainda a última, mas sentiu os dedos gelados, porque a neve voltara a cobrir tudo. Tentou erguer-se, mas não conseguiu, e ficou estendido no chão, hirto. Sobre ele caía a neve, soterrando-o.
O irmão leigo chorou, acusando-se por ter sido o causador da morte do abade, quando ele ia entrar na bem-aventurança. E depois de transportarem o abade para o convento de Ovede, os frades repararam que ele segurava qualquer coisa na mão fechada. E, quando conseguiram abrir-lha, viram que ele apertava com força os bolbos que arrancara dos musgos antes de morrer.
O irmão leigo foi enterrar os bolbos num canteiro do jardim, cuidou muito bem deles e esperou durante o ano inteiro que dessem flor. Passou a Primavera, o Verão e o Outono, e no Inverno, quando todas as outras flores estavam mortas, já tinha perdido a esperança de os ver florir. Mas, quando chegou o Natal, o irmão leigo viu com espanto que os bolbos vindos da floresta estavam cheios de flores brancas e delicadas. E verificou que aquelas flores eram iguais às que o abade João trouxera da floresta de Goinger.
Reunidos os frades em capítulo, todos concordaram que aquelas flores deviam ser mandadas ao arcebispo Absalão para comemorar o milagre.
E quando o irmão leigo foi à presença do arcebispo, estendeu-lhe as flores e disse:
— Estas são as flores que te envia o nosso abade João. São as que ele prometeu colher na noite de Natal, na floresta de Goinger.
E o arcebispo, ao contemplar as flores que em pleno Inverno tinham conseguido brotar da terra gelada e ao ouvir o que o leigo lhe contou, ficou uns segundos em silêncio e depois disse pausadamente:
— O abade João cumpriu a palavra dada, e eu vou cumprir a minha.
E mandou redigir a carta de alforria que libertava o salteador.
O irmão leigo partiu para a floresta e procurou a gruta dos salteadores. Ao encontrá-la, era outra vez noite de Natal e o ladrão veio ao seu encontro e gritou:
— Malditos sejam todos os frades! Por vossa culpa, a floresta este ano não se tornou num Paraíso como era costume em noite de Natal!
— Trago uma mensagem do abade João! — E tirando do bolso a carta de alforria disse-lhe que ele podia ir viver em sociedade com a outra gente. E mostrou-lhe o selo lacrado do arcebispo Absalão.
— De hoje em diante podes passar o Natal com os teus filhos e festejar com eles o nascimento do Menino Jesus, na companhia dos homens de bem, como era desejo do nosso abade João.
E a mulher do salteador disse:
— O abade João cumpriu a promessa. O salteador da floresta cumprirá a sua.
E quando o salteador, a mulher e os filhos abandonaram para sempre a gruta, o irmão leigo ficou a viver nela para o resto da vida, entregue às suas orações, pedindo a Deus que lhe perdoasse a sua pouca fé e dureza de coração.
O irmão leigo arrependera-se de ter pronunciado aquelas palavras malditas na noite dos prodígios a que assistira, mas o certo é que desde essa noite a floresta de Goinger nunca mais festejou o nascimento do Salvador, e de todas as maravilhas que ali se operavam só restou a flor que o abade colhera no último segundo de vida.
Puseram-lhe o nome de rosa-de-cristo, e todos os anos essa planta brota da terra gelada e cobre-se de flores brancas, como se quisesse lembrar o tempo em que floria na floresta de Goinger, em noite de Natal.
FIM
Selma Lagerlöf
Ricardo Alberty;
Maria Isabel Mendonça Soares (org.)
O livro de ouro do Natal
Lisboa, Editorial Verbo, 1978
O Clube de Contadores de Histórias
Biblioteca da Escola Secundária Daniel Faria – Baltar

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Homem na Lua - 40 anos




Apollo 11 foi a quinta missão tripulada do Programa Apollo e primeira a pousar na Lua, em 20 de Julho de 1969. Tripulada pelos astronautas Neil Armstrong, Edwin 'Buzz' Aldrin e Michael Collins, a missão cumpriu o objectivo final do presidente John F. Kennedy, que, em discurso ao povo norte-americano em 1962, estabeleceu o prazo do fim da década para que o programa espacial dos Estados Unidos realizasse este feito. Neil Armstrong, comandante da missão, foi o primeiro ser humano a pisar na superfície lunar.
Composta pelo
módulo de comando Columbia, do módulo lunar Eagle e do módulo de serviço, a Apollo 11, com seus três tripulantes a bordo, foi lançada de Cabo Canaveral, na Flórida, às 13:32 UTC de 16 de Julho, na ponta de um foguete Saturno V, sob as vistas de centenas de milhares de espectadores que lotavam estradas, praias e campos ao redor do Centro Espacial Kennedy e de milhões de espectadores pela televisão em todo o mundo, para a histórica missão de oito dias de duração, que culminou com as duas horas de caminhada de Armstrong e Aldrin na Lua.

Fonte e mais informação
Wikipedia
AFP
CDCC – Universidade de São Paulo

Teorias sobre a não ida do Homem à Lua
A fraude do século

quarta-feira, 15 de julho de 2009

A lenda da rosa-de-cristo - 1ª parte



A lenda da rosa-de-cristo
Certo dia, a mulher do salteador de estradas, que vivia numa gruta no alto da montanha de Goinger, no meio de uma densa floresta, desceu às terras baixas, acompanhada dos cinco filhos, para pedir esmola pelas aldeias. Quando a mulher do salteador batia às portas das casas, ninguém ousava negar-lhe esmola, porque todos sabiam que, como vingança, o marido viria de noite pegar fogo aos campos e aos pomares.
E foi durante uma dessas visitas pelas aldeias que a mulher do salteador e os filhos chegaram ao convento de Ovede, habitado por uns santos frades. À volta do convento corria um alto muro, e a mulher viu uma porta meio-aberta. Dirigiu-se para lá, seguida dos filhos, e entrou sem pedir licença a ninguém. Era no Verão, e a mulher encontrou-se num lindo jardim, cheio de flores de toda a espécie. Ficou tão embevecida que começou a caminhar pelas alamedas para admirar mais de perto aquela maravilha.
Ao fundo do jardim estava um irmão leigo que trabalhava no convento como jardineiro, e quando viu a mulher do salteador e os cinco filhos avançou para correr com
eles.
— Toca-me, se te atreves! — gritou a mulher do salteador.
— Isto é um convento de frades — disse-lhe o irmão leigo — e deves saber que não é permitida a entrada a mulheres.
Mas a mulher do salteador não fez caso e continuou a passear por entre os canteiros de rosas, hissopos e madressilvas. Então o irmão leigo avançou para ela e quis expulsá-la à força. Mas a mulher do salteador começou aos gritos e arranhou-o e mordeu-o, ajudada pelos filhos. O pobre irmão leigo desatou a correr para o convento, em busca de reforços, mas no caminho esbarrou com o velho abade João, que acudira a ver o que se passava no seu jardim.
O irmão leigo contou-lhe o que se passava, mas o abade censurou-o por ter usado de violência e proibiu-o de ir buscar reforços. E, apesar de velho e fraco, avançou para a mulher do salteador, que continuava a admirar o jardim. O abade João amava mais o seu jardim do que todas as coisas terrenas, e pensou que ela queria admirar as flores por nunca ter visto outras tão bonitas. E perguntou-lhe, com suavidade:
— Gostas do meu jardim?
E a mulher respondeu-lhe com mau modo:
— A princípio pareceu-me um lindo jardim, mas agora vejo que não se compara
com outro que eu conheço. Se vocês o vissem, arrancavam todas estas flores e atiravam--nas fora, como se fossem ervas ruins.
— Deve ser bonito o teu jardim, lá no alto da floresta selvagem, onde nunca entra o Sol — disse o irmão jardineiro, a rir.
— Pois eu juro que estou a dizer a verdade, e vocês, que são homens santos, deviam saber que, na noite de Natal, a floresta de Goinger se transforma num jardim que parece o Paraíso, para festejar o nascimento do Salvador. E aparecem flores tão lindas que nem nos atrevemos a tocar-lhes.
O irmão leigo riu ainda com mais vontade:
— Não percebo por que razão Nosso Senhor Jesus Cristo havia de festejar o seu
nascimento num sítio onde vivem só ladrões, como tu e o teu marido!
— É pena — gritou a mulher — tu não teres coragem para subir lá acima à floresta, na noite de Natal, para saberes que eu falo verdade.
O irmão leigo ia responder, mas o abade fez-lhe sinal para que se calasse. Porque o abade João sempre ouvira contar desde pequeno que a floresta se cobria de maravilhas na noite de Natal. E sempre desejara ver esse prodígio. Então pediu à mulher para o deixar ir visitar a gruta dos salteadores na noite de Natal. E se ela lhe mandasse um dos filhos como guia, jurou que iria só, montado num cavalo, prometendo que nunca os denunciaria e que, pelo contrário, os recompensaria como pudesse.
A princípio a mulher recusou, pensando que se tratava de uma cilada, mas depois, na ânsia de provar que o seu jardim era muito mais bonito do que o do convento, disse:
— Mas só podes ir acompanhado por uma pessoa. Eu ficaria muito desiludida se nos armasses uma cilada, porque te considero um santo homem.
A mulher saiu, seguida pelos filhos, e o abade João ordenou ao irmão leigo que não contasse a ninguém aquela conversa. Mas aconteceu que daí a dias chegou o arcebispo Absalão de Lund, e passou uma noite no convento. E foi o próprio abade que lhe falou no salteador que vivia escondido no alto da floresta, e pediu-lhe uma carta de alforria, para que ele pudesse voltar a viver honradamente entre os homens.
O arcebispo Absalão respondeu que era perigoso deixar um ladrão viver entre pessoas honestas e que era melhor deixá-lo onde estava. Então o abade contou-lhe o que
sucedia todos os anos na floresta em noite de Natal. E terminou:
— Se a graça de Deus se manifesta assim a esses desgraçados, é porque não os acha assim tão maus, e não somos nós quem pode negar-lhes a clemência humana.
Mas o arcebispo encontrou uma boa resposta:
— Prometo-lhe que, no dia em que me trouxer uma flor desse tal jardim de Natal na floresta de Goinger, lhe dou uma carta de alforria para o salteador que vive afastado de Deus.

continua………
O Clube de Contadores de Histórias
Biblioteca da Escola Secundária Daniel Faria – Baltar

A lenda da rosa-de-cristo - 2ª parte

continuação…
O abade João prometeu que lhe traria a flor, e na véspera de Natal pôs-se a caminho da floresta de Goinger, levando como única companhia o irmão leigo que tratava do jardim. Um dos filhos do salteador corria à sua frente para lhes indicar o caminho. E, conforme subiam, iam vendo as aldeias muito atarefadas nos preparativos para a festa do Natal. O abade picava esporas ao cavalo, porque estava certo de que lá em cima, na montanha, ia assistir a uma festa mais bonita do que todas as outras.
O irmão leigo suspirava e pedia ao abade que voltasse para trás, porque estava convencido de que tudo aquilo não passava de uma cilada, mas o abade não lhe dava ouvidos e continuava a cavalgar. Começavam agora a escalar a encosta e entravam na floresta selvagem e solitária. O caminho era cada vez mais difícil, coberto de pedras e de agulhas de pinheiro. Quanto mais subiam, mais o frio apertava, porque o chão da floresta
aparecia coberto por uma espessa camada de neve.
Atravessaram estreitas gargantas e bosques de vegetação espessa. E quando chegou o pôr do sol, o garoto parou numa clareira rodeada de árvores frondosas. Ao fundo da clareira erguia-se uma rocha escarpada, com uma pequena porta feita de tábuas toscas. O rapazinho correu a abrir a porta e viu-se uma profunda gruta desconfortável. A mulher do salteador estava acocorada junto de uma fogueira mesmo no centro da gruta, e junto às paredes nuas viam-se catres feitos de ramos de pinheiro e musgo. E num desses catres estava o salteador a dormir.
— Entrem — disse a mulher do salteador, sem se levantar. O abade João entrou na caverna, e o irmão leigo seguiu-o, preocupado. Os filhos do salteador estavam sentados em volta de um grande caldeirão onde se via uma sopa aguada.
— Chega-te para o pé do lume, abade João — disse a mulher — e se trouxeram farnel é melhor comerem-no, porque a nossa comida não deve agradar-vos. E se estiverem cansados, estendam-se ali sobre aqueles ramos de pinheiro.
Deitaram-se o abade João e o irmão leigo e, cansados como estavam, depressa adormeceram profundamente. Quando o irmão leigo acordou, viu o abade sentado junto do lume, a comer o seu farnel e a conversar com a mulher do salteador, que tinha acordado também. O abade João falava dos preparativos de Natal que vira durante a viagem.
— É uma pena os teus filhos não poderem andar também a brincar nas ruas da aldeia como as outras crianças e não receberem as prendas do Natal — disse o abade. E, de repente, o salteador ergueu o punho e gritou:
— Maldito frade! Vieste cá para me roubares os filhos com essas falinhas mansas?
Não sabes que sou um condenado e não posso sair da floresta?
Mas o abade fitou-o calmamente e disse:
— Já pedi ao arcebispo Absalão uma carta de alforria com o teu perdão.
— Nunca ninguém perdoará a um salteador de estradas! — gritou o bandido.
— Mas, se o arcebispo me conceder uma carta de alforria, prometo nunca mais roubar nem sequer uma galinha!
Nisto, a mulher do salteador pôs-se de pé e disse:
— Estamos para aqui a conversar e esquecemo-nos de ir à floresta ver o que lá se passa. Já ouço os sinos do Natal a tocarem ao longe.
Todos se puseram de pé e saíram da gruta a correr. Mas a floresta continuava mergulhada na escuridão e no silêncio, e o frio era muito intenso. Depois de os sinos terem tocado durante algum tempo, desceu inesperadamente do céu um raio de luar por entre os ramos das altas árvores. E tudo ficou outra vez no escuro. Daí a pouco a luz voltou de novo, como se tentasse romper as trevas. Avançava como uma espécie de nevoeiro luminoso e a pouco e pouco a noite deu lugar a um pálido amanhecer.
Então o abade viu a neve retirar-se de repente, como se fosse um tapete puxado por alguém, e começaram a surgir plantas da terra. Os fetos ergueram os seus ramos encaracolados como báculos; a urze apareceu por entre as rochas, e a giesta surgiu pavoneando as flores amarelas. Por toda a parte surgiam plantas, lucilando ao luar, como que feitas de cobre e prata.
O abade João sentiu o coração bater com mais força ao assistir ao despertar da floresta. De repente, a luz começou a diminuir e o abade receou que tudo voltasse às trevas.
Mas surgiu uma nova onda de luz que se derramava sobre a floresta. E, agora, ouvia-se o murmurar dos riachos e o chalrar das cascatas. E as árvores ficavam revestidas de folhas, como se um bando de borboletas tivesse vindo pousar sobre os ramos nus. Não eram só as flores e as árvores que tinham acordado. Os cruza-bicos começaram a saltitar de ramo em ramo, e os pica-paus martelavam nos troncos duros. Um bando de estorninhos descansou no alto de um abeto e seguiu viagem. Quando outra vaga de luz inundou novamente a floresta, começaram a florir as groselhas e os murtinhos.
Bandos de gansos bravos e de grous atravessaram o céu, os tentilhões construíam os ninhos e os esquilos jogavam às escondidas por entre as ramagens.
Tudo aconteceu tão de repente que o abade João não teve tempo de reflectir acerca do milagre que presenciava. Outra vaga de luz trouxe o cheiro de campos lavrados de fresco. Ouvia-se ao longe o tilintar dos chocalhos das vacas e dos carneiros. Os pinheiros e os abetos cobriram-se de pinhas vermelhas que pareciam forradas de seda. O zimbro encheu-se de bagas que mudavam de cor a cada instante. E flores silvestres atapetavam o chão como uma alcatifa de mil cores. O abade João curvou-se para colher uma flor de morangueiro e, enquanto se endireitou, a flor transformou-se em fruto na sua mão.
A raposa saiu da toca seguida da sua ninhada de raposinhos. O mocho, que havia pouco tinha começado a sua caçada nocturna, surpreendido por tanta luz, regressou ao seu esconderijo no escuro. E foram surgindo novas marés de luz e de ar quente, e agora ouviam-se os patos grasnar para os lados dos pântanos. O pólen das flores pairava no ar como uma poalha dourada e surgiam de toda a parte borboletas, que pareciam lírios a voar. Uma colmeia de abelhas, no buraco de um velho carvalho, estava tão cheia que o mel escorria pelo tronco abaixo. Pelas escarpas, as roseiras trepavam ao desafio com as amoras silvestres e, lá no alto, apareciam flores enormes, como caras a espreitar.
Foi então que o abade João se lembrou da flor que prometera ao arcebispo. Mas cada flor que surgia era mais bela do que a anterior, e ele queria colher a mais bela de todas.
As vagas de luz e de calor seguiam-se umas às outras e a atmosfera estava tão densa que parecia feita de ouro coalhado. «Não sei o que a próxima onda de luz possa trazer de mais belo e deslumbrante», pensou o abade João. Mas a luz continuava a aumentar, e ele apercebeu-se de que qualquer coisa ainda distante se ia aproximando. Sentiu-se rodeado por uma atmosfera sobrenatural e, a tremer, esperou. Desceu sobre a terra um profundo silêncio, os pássaros emudeceram, os raposinhos e os esquilos pararam de brincar e até as flores deixaram de crescer nos cálices. Era tal a sensação de bem-aventurança que o abade João julgou que o coração lhe parava. A sua alma sentia ânsias de entrar na eternidade.
Ouviram-se então, ao longe, uns sons de harpa, acompanhados de coros celestiais. O abade juntou as mãos e ajoelhou com a face banhada por um resplendor de glória. Nunca esperara sentir neste mundo a bem-aventurança do além.
Outro tanto não sentia o irmão leigo, que ficou furioso, porque no seu jardim do convento, por mais cuidados que tivesse, não conseguira nunca ter flores tão lindas. E não percebia como é que Deus desperdiçava tantas maravilhas para as oferecer àquela família de ladrões que nem sequer respeitavam os seus mandamentos. «Isto não pode ser obra de Deus — pensou — pois que se apresenta a pessoas tão ruins. Isto é obra do diabo, que nos faz ver o que não existe. Não sairemos salvos deste bruxedo e cairemos no abismo!»
Agora as hostes dos anjos tinham-se aproximado tanto que o abade sentia o esvoaçar das suas asas e via-lhes as sombras luminosas. O irmão leigo também os via, mas continuava convencido de que tudo aquilo era obra do demónio, para o perder, mais ao abade, em plena noite de Natal. E então gritou tão alto que a voz ecoou no fundo da floresta:
— Arreda, demónio! Volta para o inferno que te enviou!
continua…
O Clube de Contadores de Histórias
Biblioteca da Escola Secundária Daniel Faria – Baltar

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Gripe A

gripe A

Rede de Bibliotecas Escolares - Newsletter n.º 5


Rede de Bibiotecas Escolares
Portal da Educação


Newsletter 05

Ab Initio

É preciso ter a consciência dos desafios que a sociedade da informação coloca às bibliotecas, destacadamente o ambiente digital que hoje avança inexoravelmente como uma onda que vai progredindo a uma velocidade cada vez maior e que é preciso acompanhar para não soçobrarmos nela.

Editorial

Maria Teresa Calçada - Coordenadora do Programa da Rede de Bibliotecas Escolares

Candidaturas RBE: 13 anos a construir bibliotecas

Apesar das correntes pedagógicas, que desde meados do século XX, propunham novos modelos de aprendizagem, é sobretudo a partir dos anos 80 que, em Portugal, estratégias de ensino assentes na ideia de construção do conhecimento e de promoção de autonomia dos aprendentes ganham nova expressão.

A auto-avaliação da biblioteca escolar

A escola da Sociedade do Conhecimento tem que lidar com os desafios que as tecnologias da informação colocam às atitudes, hábitos e comportamentos informacionais dos jovens. Estes desafios decorrem de renovadas formas de acesso, uso, produção e comunicação do conhecimento, que permeiam diferentes niveis de acção: da aprendizagem formal à informal, ao lazer e à intervenção social.

Documentaliste dans l'Education nationale en France : un statut d'enseignant, des fonctions hybrides et une identité incertaine

Les CDI sont largement intégrés dans le paysage éducatif des établissements du 2° degré en France (collège et lycée), car depuis 1989, il est acquis que chaque établissement scolaire en est doté. Créée en 1974, la structure CDI coïncide avec l'émergence de nouvelles démarches pédagogiques, favorisant le travail autonome sur documents, et avec l'instauration du collège unique et donc l'arrivée d'un public scolaire plus diversifié.

Bibliotecas Escolares numa Plataforma Moodle? Porquê e para quê?

Será que as Bibliotecas escolares podem ser, na escola, algo próximo das "novas praças públicas" de que fala Talscott (2008) - "locais de encontro movimentados onde os consumidores regressam para usufruir de experiências enriquecedoras e envolventes. Afinal as relações são a única coisa que não se pode transformar num produto"

Onde a leitura também se enreda

Temos por vezes a impressão que nos confrontamos com o fim de uma ilusão. Acreditámos que para pôr toda a gente a ler, para resolver os problemas da leitura e da literacia, seria suficiente a alfabetização e a melhoria da oferta de recursos de leitura.

Biblioteca 2.0

O contributo da biblioteca escolar (BE) pode ser estruturado em dois grandes eixos. O primeiro será o ensino da literacia da informação, isto é, o desenvolvimento da capacidade de transformar a informação em conhecimento, pois é reconhecido por todos que a abundância de informação e a facilidade de acesso à mesma não garante indivíduos mais bem informados; o segundo eixo de acção da BE será a promoção da transversalidade dos saberes, gerindo a inovação e a mudança, e contrariando a progressiva segmentação, simplificação e descontextualização dos recursos de informação disponíveis on-line.

Redes locais de bibliotecas: construção de parcerias

No actual contexto de uma sociedade da informação, onde emergem novos paradigmas educacionais, e onde a amplitude das mudanças tecnológicas, a disseminação da informação, o desenvolvimento do digital, das redes físicas e virtuais favorecem a expansão das sociedades em rede, a consolidação de redes locais de bibliotecas afigura-se como imprescindível. Neste sentido, e no âmbito dos pressupostos do programa Rede de bibliotecas Escolares, apresentamos uma reflexão sobre dinâmicas colaborativas subjacentes à criação de Redes Locais de Bibliotecas, fazendo sobressair a importância do envolvimento das entidades locais em benefício de uma efectiva parceria. Motivo pelo qual, o texto que se apresenta, é também o resultado de opiniões escritas de alguns intervenientes nesses processos.

Fórum RBE

Reportagem fotográfica do Fórum RBE - 26 de Junho de 2009

A nossa biblioteca

Os alunos da Escola EB 2,3 de São Pedro do Sul apresentam a sua visão da biblioteca da escola.




domingo, 5 de julho de 2009

O homem que tinha uma árvore na cabeça - 3ª parte

O homem que tinha uma árvore na cabeça
… continuação
Arbóreo viu que se chamava «Somnium», que significa «sonho» em latim, e, passando rapidamente os olhos pelas páginas carregadas de caracteres e de desenhos, percebeu que falava de uma viagem imaginária à Lua, a qual, segundo Kepler já lhe dissera, devia ser habitada por seres capazes de cavar as grandes crateras que se viam na sua superfície rugosa e iluminada.
– Deve ser um livro muito belo – comentou Arbóreo.
– E também perigoso – acrescentou Kepler – porque defende ideias raras que não agradam àqueles que mandam nos reinos desta Terra.
Dizendo isto partiu, misturando-se com as sombras esguias do crepúsculo. De Praga foi para a cidade de Vurtemberga, onde, disfarçando as lágrimas, encontrou a mãe acorrentada numa masmorra, acusada de vender ervas misteriosas que alucinavam e faziam enlouquecer. Ele sabia-a inocente, mas não tinha meios para o provar. Aquele era um tempo de crueldade e de intolerância. Ninguém ouvia ninguém, ninguém lutava para demonstrar a inocência de ninguém.
Quando regressou a Praga, viajando por campos e aldeias saqueados e destruídos pelo fogo, já não encontrou a mulher e o filho vivos. Correu para o parque e, porque esta é uma história triste e desolada, deparou com uma clareira no sítio onde costumava conversar com Arbóreo. Tinham-no levado.
Um velho carvalho, ali mesmo ao lado, segredou-lhe com grossas lágrimas de seiva a escorrerem-lhe pelo tronco:
– Levaram-no a ele e a muitas outras árvores, porque dizem que precisam de lenha para alimentarem as caldeiras e de madeira para construírem torres de assalto e aríetes para arrombarem portas de castelos. Vou sentir a sua falta. Embora fosse mais árvore que homem, gostava muito dele. Entendíamo-nos muito bem. Levou consigo pássaros e borboletas, os seus companheiros de sempre. E também muitas ideias dentro da cabeça.
Kepler não soube o que havia de responder. Era um daqueles momentos em que as palavras não têm qualquer valor, sobretudo se forem trocadas entre um astrónomo e uma árvore.
Cobriu o rosto com a capa negra, para ninguém o ver chorar, e partiu sem bagagem para outra cidade.
Voltou a ter-se notícias dele em Sagan, uma cidade da Silésia, onde fazia horóscopos para o duque Wallenstein. Ele que era astrónomo e não astrólogo, ou seja, cientista e não adivinho, não deve ter passado com alegria os últimos anos da sua vida, pois ninguém fica feliz por ter de fazer, só para comer, aquilo de que não gosta, aquilo que vai contra os seus princípios e desejos.
Todos os dias o duque, sentado no seu trono de veludo e ouro, lhe dizia:
– Que posso esperar hoje dos astros, mestre Kepler? Se não estiverem de feição, nem me arrisco a deixar o castelo.
E o pobre Kepler fazia das tripas coração e lia nos astros coisas que a ciência desmentia.
Quando morreu, triste e solitário, ordenou que escrevessem na pedra da sua sepultura: «Medi os astros, agora meço as sombras. O Espírito volta-se para o céu, o corpo repousa na Terra».
Há quem garanta que, depois de ser sepultado, apareceu junto da campa uma árvore que nunca ninguém ali vira antes. Era uma árvore de fruto, com o tronco largo e ramos que pareciam braços estendidos em direcção ao céu, como se quisessem abraçar as estrelas.
As crianças que faziam rodas à volta da árvore começaram a espalhar a notícia de que ela falava e de que parecia ter, no meio do tronco, dois olhos de onde escorriam abundantes lágrimas. Mas ninguém se atreveu a acreditar nelas. Uma das crianças chegou mesmo a ver, desenhada na casca grossa, a palavra «Arbóreo», mas não sabia o que significava. Ninguém sabia.
Mais de trinta anos passaram sobre o desaparecimento de Kepler e de Arbóreo até que nasceu em Inglaterra um menino muito pequeno e doente, tão pequeno que a mãe dizia que cabia dentro de uma caneca de cerveja. Tinha no rosto tamanhos sinais de doença que parecia nunca ter visto a luz do sol. Chamava-se Isaac Newton, e deve ter lido no grande livro do céu as conversas fantásticas de Kepler com Arbóreo. Da sua cabeça não nasceu nenhuma árvore, mas ideias de luz que transformaram a compreensão do Universo e a vida dos homens.
Diz-se até que foi a uma árvore rara que Newton foi buscar a maçã que usou para demonstrar a Lei de Gravidade. Explicava ele que a mesma força que atrai a maçã para a Terra mantém a Lua na sua órbita. Essa maçã tinha um sabor igual ao dos frutos que cresciam na cabeça de Arbóreo.
* * *
Nota do Autor
«O Homem que Tinha uma Árvore na Cabeça» não é um livro sobre ciência, embora nele se fale de três cientistas: João Kepler, Tycho Brahe e Isaac Newton. Os dois primeiros são contemporâneos, ou seja, viveram na mesma época. O terceiro, dos três o mais célebre, nasceu doze anos depois da morte de Kepler. Que cientistas foram estes? Tycho Brahe nasceu em Knudstrup, na Dinamarca, em 1546, e morreu em Praga em 1601. Rico e dedicado ao estudo da astronomia, ajudou Kepler nos momentos difíceis da sua vida e apontou-lhe o caminho para o que viria a ser a Lei sobre o Movimento dos Planetas.
Johannes (João) Kepler nasceu perto de Weil, Wurttemberg, na Alemanha, em 1571, e morreu em Regenburg, também na Alemanha, em 1630. Teve uma vida que a doença, a pobreza e a guerra tornaram muito dura, mas nunca deixou de estudar e de trabalhar. Sem as conclusões científicas a que chegou, nunca Isaac Newton teria enunciado o Princípio da Atracção Universal, que provocou uma verdadeira revolução na Física e na relação do Homem com a Natureza e com o Universo.
Isaac Newton nasceu em Woolsthorpe, Inglaterra, em 1642, e morreu em Kensington, Inglaterra, em 1727. Alcançou, com o seu trabalho como matemático, físico e astrónomo, popularidade e fortuna, sendo considerado um dos génios do pensamento científico. Formulou a teoria da composição da luz branca, descobriu as Leis da Atracção Universal e, ao mesmo tempo que Leibniz, achou as bases do Cálculo Diferencial.
Quando se fala do episódio da «maçã de Newton», referido também no fim desta história, dá-se como verdadeiro o seguinte: um dia o cientista terá visto cair uma maçã, concluindo que o movimento da Lua se podia explicar por uma força da mesma natureza. Estendeu essa teoria aos planetas do sistema solar e os cálculos que fez permitiram-lhe confirmar as leis anteriormente enunciadas por Kepler.
A pequena história que vos quis contar, se alguma coisa tenta dar a ver, é que os grandes avanços na história da ciência e na vida da humanidade resultaram sempre da soma de esforços, trabalhos, sonhos e lutas de homens e mulheres que, em muitos casos, nem sabiam da existência uns dos outros. Havia somente um fio a uni-los: o da inteligência e o da capacidade de sonhar.
Ao falar de Kepler, Brahe e Newton nada quis ensinar ou explicar. Tentei apenas contar uma história inventada (Arbóreo nunca existiu) em que também há lugar para figuras reais, por sinal três cientistas. O resto é poesia, imaginação, gosto de inventar. Inventem, vocês também, outras histórias a partir desta. As histórias melhores são sempre as que abrem portas para outras histórias. E já agora, espero que a leitura de «O Homem que Tinha uma Árvore na Cabeça» crie em vós o interesse pelas coisas da ciência. E também pelas da literatura.
FIM
José Jorge Letria
O homem que tinha uma árvore na cabeça
Porto, Porto Editora, 1991
Adaptação
O Clube de Contadores de Histórias
Biblioteca da Escola Secundária Daniel Faria – Baltar